O primeiro dia do Ciclo de Debates Mobilidade Urbana – Construindo Cidades Inteligentes, promovido pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), terminou com a constatação que faltam projetos de mobilidade urbana nas cidades brasileiras e que as políticas públicas ainda se pautam pelo uso do transporte individual automotor.
Dados que exemplificam que a população brasileira é estimulada a comprar carros e motos ao invés de usar transporte público foram apresentados por Ribeiro de Carvalho Carlos ,técnico de Planejamento e Pesquisa da Coordenação de Estudos Urbanos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Ele citou informações do IBGE: entre 2002 e 2012, registrou-se o aumento de 77% na inflação (medido pelo IPCA) enquanto, no mesmo período, preço do veículo novo subiu 4%, motocicletas 3% e gasolina 41%. Já a passagem de ônibus e metrô subiram 111% e 94% respectivamente. O pesquisador também ressaltou um dado preocupante: a alta taxa de mortes no trânsito . Enquanto em países desenvolvidos a taxa é de nove mortes para cada 100 mil habitantes, o Brasil ostenta a triste marca de 21,5 para cada 100 mil. Se comparado à taxa média mundial, 18 mortes a cada 100 mil, o Brasil também supera essa marca.
Durante o evento, algumas declarações causaram desconforto. Exemplo disso foi a do Presidente da Câmara Automotiva Mineira da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Fábio Sacioto, que em sua exposição alegou que “o poder público deveria intensificar a fiscalização para impedir carros velhos de trafegarem”, ou seja, é preciso colocar carros novos e “sustentáveis” na rua.
Outras exposições controversas ficam por conta do sr. José Aparecido Ribeiro, Presidente do Conselho Empresarial de Política Urbana da ACMinas (Associação Comercial de Minas). Na oportunidade, ele afirmou que deveria existir placas alertando os pedestres a terem cuidado com os carros e que o pensamento de mobilidade urbana contemplando os diversos modais é uma visão romântica e inviável.
Já o professor Geraldo Spagno Guimarães, da Fundação João Pinheiro, lembrou-se da Lei Federal 12.587, Política Nacional de Mobilidade Urbana, de 2012 e se declarou um “romântico” em resposta a José Aparecido. O fez por acreditar na política de desenvolvimento urbano que prioriza os modos de transporte não motorizados em, em seguida os coletivos e, por fim, os motorizados individuais.
O ultimo palestrante, e mais esperado pela BH em Ciclo, João Paulo Amaral (JP), gestor ambiental, especialista em Consumo Sustentável e Mobilidade do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e idealizador do projeto Bike Anjo, encantou os participantes do evento. JP demonstrou como o Brasil chegou ao estado atual da (i)mobilidade urbana graças às construções de modelos mentais que reproduzem modelos de mobilidade falidos e centrados no uso do automóvel individual. Ele mostrou, em imagens, situações corriqueiras no trânsito de SP que revelam esse modelo instituído e que marginaliza pedestres e ciclistas.
Calçadas bloqueadas por carros, mesas de bares (que se estendem para criar um espaço para fumantes), guaritas, recapeamento das pistas sem a sinalização obrigatória e a impunidade, que é, segundo JP, o pior modelo mental existente. JP afirma isso por acreditar que a impunidade legitima infrações como invadir calçadas, ciclovias ou ocupar espaços destinados aos portadores de necessidades especiais.
JP frisou que a solução para a mobilidade urbana nos grandes centros urbanos passa pelo repensar da ocupação territorial, quais os principais fluxos, para onde as pessoas estão indo e como integrar os diversos modais. O bike anjo terminou sua apresentação com a melhor reflexão do dia acerca do papel central do ser humano nos diversos modelos de transporte: “É importante utilizar os diversos meios de transporte, mas priorizar o elemento comum a todos eles: o ser humano.
Gil Sotero